Doutoranda em Sociologia pela UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), Tânia Bernardelli é especialista em Políticas Públicas e já trabalhou como consultora para instituições como o Banco Mundial. Quando se tornou mãe de Mariá, em 2015, passou a conciliar suas tarefas de mãe e de profissional, assim como fazem tantos milhões de mulheres no Brasil e no mundo.
No final de 2016, após passar por um processo seletivo, foi contemplada com uma ‘bolsa sanduíche’ – de curta duração – na Espanha. Conversou com o pai de sua filha, de quem já estava separada, sobre a ida das duas por esse período para a Europa. Ela conta que ele concordou e estava tudo certo para que o passaporte da pequena fosse feito e elas partissem para essa breve temporada de especialização profissional da mãe.
Tudo mudou quando, nesse meio-tempo, Tânia acionou a Justiça devido ao não pagamento de pensão alimentícia da filha. O ex mudou de ideia e decidiu que não autorizaria mais a ida da menina. A partir daí, acordos verbais foram quebrados, ele levou a filha do Rio de Janeiro ao Pará sem autorização e bloqueou o contato de Tânia com Mariá já no segundo dia em que ela estava na Espanha.
Agora, a mãe luta pela guarda da filha e para recuperar o laço afetivo que percebeu estar enfraquecido. Com exclusividade para o Bebê.com.br, ela abriu o seu coração e nos contou a sua história. Confira:
“Tenho uma vida acadêmica intensa, o que parece não ser levado em conta quando analisam meu caso. Sou do Mato Grosso do Sul e moro há seis anos no Rio de Janeiro. Estou no último ano do doutorado em Sociologia pela UERJ, sou especializada em Políticas Públicas.
Conheci o pai da minha filha em 2013. Em março de 2015 nasceu Mariá, do jeito que eu havia desejado: em um parto humanizado. Consegui amamentá-la em livre demanda até os dois anos de idade.
Em maio de 2016 nos separamos. Houve uma agressão física enquanto eu estava com Mariá nos braços e achei melhor acabar com o relacionamento.Fiquei com a guarda dela, mas nunca impedi o contato dele com a filha. Muito pelo contrário: ela sempre esteve com ele e com os irmãos, que são filhos de um relacionamento anterior do pai. Precisei viajar a trabalho duas vezes e ele ficava com ela nos horários em que não estava trabalhando – no restante do dia, ela ficava com a babá. Tudo sempre correu bem.
No final de 2016, recebi a confirmação de que havia sido contemplada para uma bolsa sanduíche, de seis meses, na Espanha. Nesse momento, estávamos em uma briga por causa da pensão alimentícia da Mariá, que ele parou de pagar quando comecei a me relacionar com meu atual companheiro. Mesmo assim, conversamos sobre a ida à Espanha e ele concordou, estava tudo certo.
Quando a Justiça foi acionada por causa do não pagamento da pensão alimentícia, em março de 2017, ele ficou furioso, mandou e-mails horríveis para mim. Logo em seguida, veio a resposta da verba da bolsa e tínhamos que ir. Ele então decidiu que proibiria a ida de Mariá comigo, não autorizou a emissão do passaporte.
Entrei com um processo de suprimento de outorga paterna, para conseguir fazer o passaporte dela mesmo sem a assinatura dele, e adiei minha ida em 15 dias. Achei que o Judiciário seria mais rápido, por se tratar de um bebê, mas o processo não andou. Marcamos audiências para regularizar a situação, ele não foi a nenhuma.
Acabei fazendo um acordo verbal com ele para ficarmos cada um por três meses com ela durante minha bolsa. Ele ficaria os três primeiros meses, enquanto eu organizava a vida por lá, e então ela ficaria comigo até o final.
Fui em abril de 2017. Conversei com ela, expliquei por que estava indo e que logo estaríamos juntas novamente.
No primeiro dia, falei com Mariá por vídeo do Whatsapp, tudo normal. No segundo dia, quando chamei pelo Whats, ele me bloqueou. Em seguida, mandou uma mensagem dizendo que eu só teria notícias de minha filha por e-mail. Nos cinco meses e meio que fiquei fora, não consegui mais ver minha filha ao vivo nem conversar com ela.
Fiquei desesperada, pedi para minha mãe intermediar. Ela solicitava vídeos e fotos da Mariá, ele mandava e ela encaminhava para mim. Gravei um vídeo por dia para ‘falar’ com ela, mas não sei se ela chegou a ver.
Um mês e meio antes de voltar, comecei a mandar e-mails avisando a data em que estaria de volta ao Rio. Ele começou a não responder. Achei que algo estava estranho.
No dia 4 de outubro, cheguei. Fui buscá-la e ele não atendia o telefone. Mandei uma mensagem no Whats pelo celular do meu companheiro, ele visualizou e bloqueou. Fui ao prédio em que ele morava e o porteiro disse que ele tinha mudado havia meses.
Me deu um estalo de que ele poderia estar no Pará, porque ele estava envolvido com uma mulher de lá desde quando estávamos juntos.
Fui à polícia, mas não quiseram registrar um BO, alegando que ‘pai não sequestra filha’. No plantão judiciário disseram que não cuidam de casos de fora. A defensoria pública não queria aceitar meu pedido de busca e apreensão da minha filha, mas acabou aceitando porque um dos pais não pode mudar o endereço da criança sem comunicar a outra parte.
No dia seguinte, 5 de outubro, segui minha intuição e comecei a ligar em todas as escolas de Marabá, no Pará. Depois de algumas ligações, descobri a escola em que Mariá estava matriculada. Fui para lá em outubro mesmo, mas ele a havia tirado daquela escola no dia 7, quando soube que eu tinha ligado lá.
Desesperada, falei por telefone com a atual companheira dele e foi horrível. Ela disse que minha filha não tinha mais afinidades comigo, que estava começando a chamá-la de ‘mãe’. Foi ali que percebi a gravidade da situação.
Em Marabá, fiquei sabendo que ele tinha pedido a guarda unilateral, alegando que eu havia saído do país sem previsão de volta. O juiz de Marabá deu ganho de causa para mim e recomendou que o processo fosse julgado no Rio.
No dia 26 de março, aniversário de 3 anos de Mariá, o juiz de Marabá deu a busca e apreensão dela. Ela não estava na nova escola. Fomos à casa deles e ninguém estava lá. Ele soube um pouco antes que estávamos chegando e sumiu.
Passei dez dias tentando ver minha filha e não consegui, então decidi fazer vigília na frente da casa. Percebi que eles estavam em casa e entrei. Eles chamaram a polícia e eu fiquei esperando, porque queria que a polícia tomasse conhecimento mesmo. Acabamos todos na delegacia, eles fizeram um BO contra mim por invasão de domicílio.
Expliquei para o delegado o que estava acontecendo e ele ficou indignado. Se ofereceu para mediar meu encontro com Mariá naquele dia mesmo. Só então consegui vê-la.
Cheguei em um quarto todo rosa, cheio de bonecas brancas, diferente de tudo que estava sendo feito na educação dela, que é negra. Expliquei para ela o que estava acontecendo, que eu tinha voltado, como havia prometido. Ela não reagiu. Não veio para o meu colo, não me chamou de mamãe. Foram 15 minutos, rodeadas de pessoas, mas pude perceber ali o estrago que já está feito no nosso relacionamento.
Voltei ao Rio e o processo vai correr aqui. Eles querem que eu peça a guarda, mas ele não tem a guarda, nem provisória. O que ele tem é uma guarda de fato, porque está com ela, porém é uma guarda ilícita. Por mim, eu nunca teria me separado da minha filha. Ela teria ido comigo ou, pelo menos, teríamos tido contato diariamente, como combinado.
Nosso maior questionamento é o tratamento do Judiciário. Ele pediu a suspensão da busca e apreensão de Mariá e foi atendido, sem ninguém me ouvir. Tudo que peço, mesmo com todas as provas físicas, só é considerado depois de ele ser ouvido. Não posso perder minha filha por ser uma profissional e estudar. Esperamos reverter essa situação. Espero voltar a construir os laços com a minha filha, recuperar esse ano que nos foi tomado.”
Por Raquel Drehmer | Bebe.com.br